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A briga de Ana e Manu em 'A Vida da Gente' é tão épica assim ou os noveleiros são emocionados demais

  • Foto do escritor: Natália  Rocha
    Natália Rocha
  • 13 de jul. de 2023
  • 5 min de leitura

Atualizado: 10 de mai.


Cena de A Vida da Gente
Manuela e Ana tem uma discussão intensa em 'A Vida da Gente' | Foto: Reprodução/TV Globo

O que torna uma cena tão inesquecível a ponto de fazê-la entrar no Hall de grandes cenas da nossa teledramaturgia? Essa é uma pergunta que envolve muitos fatores e costuma ser relativa devido ao gosto individual.


Com o crescimento das redes sociais, trechos, desde os curtos até os longos de várias novelas estão sempre circulando na timeline, no feed dos noveleiros e do público em geral, algo que nos faz matar as saudades de alguma trama em específico, mas também nos dá aquela sensação de que a novela não tem um descanso.


'A Vida Da Gente' (2011) é uma das novelas que, na opinião popular, tem uma cena digna de Oscar. A famosa briga entre as irmãs Ana (Fernanda Vasconcellos) e Manuela (Marjorie Estiano) é sempre lembrada, ovacionada e aclamada pelos seus fãs que gera a sensação de que a novela se resume a esse momento.


Por que essa cena é tão reverenciada? O que ela tem? Merece o hall de grandes cenas ou é muita emoção dos noveleiros?


Novelas de Lícia

A avó Iná e suas netas em A Vida da Gente
Iná ( Nicette Bruno), Ana ( Fernanda Vasconcellos) e Manuela ( Marjorie Estiano ) viveram avó e netas em 'A Vida da Gente' | Foto: Globo/Renato Rocha Miranda

A trama da autora é uma grande crônica, gênero esse que a faz sempre ser comparada com o veterano Manoel Carlos, um mestre na crônica do cotidiano com suas inesquecíveis Helenas. Lícia tem elementos parecidos com o colega, mas com a diferença que em suas novelas, ela sempre convida o público a pensar, a refletir sobre questões importantes, dilemas presentes na vida de qualquer pessoa.


O próprio título da novela indica inúmeros conflitos que se você não passou, pelo menos conhece alguém que já viveu: uma mãe que escancara sua preferência por determinado filho (a) como é o caso de Eva (Ana Beatriz Nogueira), a difícil relação dela com a própria mãe Iná (Nicette Bruno) a avó das meninas, casamentos em crise, questões da terceira idade, entre outras.


Ana e Manuela são duas irmãs que se amam muito, são melhores amigas e uma é tudo que a outra tem. Eva, a mãe nunca escondeu sua preferência por Ana e faz questão de escancarar a rejeição por Manu, que recebe carinho da avó. Ana tem o desejo de viver seu amor com Rodrigo (Rafael Cardoso), mas enfrenta o excesso de controle da mãe, tem que lidar com uma gravidez que interrompe a carreira de tenista.


Um dia, Ana resolve fugir com Manu e a filha ainda um bebê ao percorrer a estrada rumo a casa da avó, acabam sofrendo um acidente. Manuela e Júlia conseguem sair com vida, mas Ana acaba ficando em como pôr anos e nisso, Manu se vê diante de um grande desafio que é seguir em frente com sua vida e ajudar na criação da sobrinha, mas no meio do caminho, acaba se apaixonando por Rodrigo, se casando e enquanto a irmã está em coma, Manuela vive uma vida que para alguns seria a de Ana.


O tempo passa, Ana acorda do coma, se recupera e deseja conquistar o amor da filha Júlia. Em meio a isso, ela acaba se envolvendo com o médico Lúcio (Thiago Lacerda), mas começa a se questionar sobre seus sentimentos com relação a Rodrigo e também se envolve com o rapaz, algo que prejudica o casamento dele com a irmã Manu.


A briga

Ana e Manu em uma cena de briga
Manuela e Ana brigam como uma forma de colocarem para fora tudo que sentem diante dos acontecimentos de suas vidas | Foto: Reprodução

Prestes a se casar com Lúcio, Ana e Manuela acabam brigando por conta de toda a questão envolvendo Rodrigo. É na entrega do convite de seu casamento que Ana vê uma oportunidade de tentar se acertar com a irmã que está há meses afastada dela.


A cena que ocorre a briga das irmãs dura cerca de 8 minutos e 4 segundos e temos uma atuação impecável de Fernanda Vasconcellos e Marjorie Estiano. Uma sequência com diálogos longos, o que pode ser considerado uma eternidade para a época em que foi exibida, onde já se notava mudanças na linguagem dos folhetins, que adotaram mais dinamismo para não perder a atenção do público. Mesmo com esse fator, Lícia foi uma exceção à regra e valorizou o diálogo, uma das marcas de seus trabalhos que consagrou a cena, somada a entrega das atrizes na cena.


É uma sequência forte, potente e com elementos interessantes de serem analisados como: a lavação de roupa suja ali, nada mais é que as irmãs colocando para fora toda a mágoa que sentem, a quebra da confiança uma na outra e como isso abalou a relação delas, o exercer a maternidade de Júlia e a importância de cada uma para a garota, a vida de Ana entre passado e presente, o amor com relação a Rodrigo.


Na cena em questão, Manuela tem seu momento gigante, assim como Ana. O ponto alto de tudo é o que podemos chamar de "barraco dialogado", algo muito presente no ‘’Líciaverso”. Em várias novelas, o público espera um acerto de contas, brigas intensas e Lícia presa pelo barraco sem agressões físicas, mas sim agressões verbais, aquelas que doem na consciência e mexem com os sentimentos.


Outro detalhe é a briga ser um momento para movimentar torcida, ou seja, quem é time Ana acha que ela tem razão, quem é time Manu idem, e há os que não tem torcida declarada e entendem que tudo o que aconteceu foram movimentos que a vida, o destino e o tempo fizeram, mas que, no fundo, torcem para que as irmãs se acertem.


Todos esses elementos tornam a cena incrível, memorável para algumas pessoas. Realmente é uma cena intensa e muito interessante, mas a novela não se resume nela. Há embates como de Iná com a filha Eva que são fortes, os momentos de sabedoria que a avó das meninas compartilha e Vitória (Gisele Fróes) a treinadora de Ana que é linha dura e pega pesado com o marido Marcos (Ângelo Antônio) que é considerado um dos "homens bananas" presentes no Líciaverso.


O ouro da cena

A atuação, o diálogo, a forma como tudo acontece dá esse tom de ser incrível, mas o grande trunfo da cena é a capacidade que a autora tem de colocar uma questão que é muito presente na nossa realidade. Não existe certo ou errado ali, pois, tanto Ana quanto Manu tiveram seus acertos e erros. Essa forma de contar histórias não é tão didática, mas é interessante porque nos faz refletir e ver que o bem e o mal estão presentes em nós mesmos, em várias intensidades.


'Um Lugar ao Sol' (2021), por exemplo, foi a primeira aventura da autora no horário nobre, teve seus problemas e foi uma obra fechada por conta da pandemia de Covid-19, mas em meio ao caos, teve seus pontos altos. O protagonista Christian (Cauã Reymond) era bom, íntegro e sonhava em ter oportunidades, o seu lugar ao sol. Com o passar o tempo e as dificuldades da vida, ele endurece, tende assumir uma outra identidade e esse "novo eu" e para ter o sonhado lugar ao sol, deixa aflorar o que há de pior em si e isso tudo chega em um nível que não há como reverter mais a situação.


A grande discussão foi ética e moral, ou seja, o lado de luz e sombra que Christian tinha e como estes lados foram evidenciados em diferentes momentos. A grande jornada que Lícia propôs ao público é essa análise de valores que todos nós temos.


A Vida da Gente tem grandes cenas, não só a briga das irmãs que já está no hall de grandes cenas da teledramaturgia brasileira, mas outras que nos fazem refletir sobre a vida. Seja na trama das seis ou às nove, o que sabemos é que Lícia Manzo sempre vai tocar em questões que não queremos resolver na nossa vida e, independente do horário, o que o público realmente quer são novas cenas épicas assim como essa que rendeu esse texto.

© Copyright - Natália Rocha.

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